História da Residência Médica


No final do século XIX a medicina progredia a passos acelerados: com a descoberta da anestesia, a cada dia um novo procedimento cirúrgico era desenvolvido na Europa. O jovem cirurgião William Halsted foi nessa época à Europa para aprender com os grandes mestres e voltou aos EUA com a mente cheia de ideias e ânsia para trabalhar. Cirurgião workaholic e renomado, Halsted foi um dos "Big Four" da fundação do Hospital Johns Hopkins e como primeiro chefe do Departamento de Cirurgia do Hospital, decidiu criar o primeiro programa oficial de Residência Médica.
"He who studies medicine without books sails an uncharted sea, but he who studies medicine without patients does not go to sea at all." - William Osler
Em 1889, Halsted criou um programa para treinamento de jovens cirurgiões à sua semelhança: um super-humano numa formação com ênfase em heroismo, abdicação e diligência. Seu modelo de treinamento se baseava num estilo de vida restrito com dedicação integral dos trainees aos seus pacientes. Eram chamados residentes porque de fato moravam no hospital e, consequentemente, estavam disponíveis 24h todos os dias para atender as intercorrências dos seus pacientes. O modelo de Halsted defendia que a cirurgia deveria ser aprendida através do treinamento prático em um programa hierárquico. Assim sendo, a residência médica tinha 03 etapas: um ano como interno, 06 anos como residente assistente e 02 anos como "house surgeon", uma espécie de preceptor. Um dos residentes mais famosos de Halsted nessa época foi Harvey Cushing, "pai" da neurocirurgia.


Halsted operando com seus residentes Cushing e Young (1903-1904)

Logo em seguida à Halsted, William Osler abriu uma programa de Residência em Medicina Interna no Johns Hopkins. A base do seu treinamento era o ensino à beira do leito e uma estrutura hierarquizada com muitos internos, alguns residentes e um residente-chefe. Assim como no programa de Cirurgia de Halsted, os alunos de Osler ficavam cerca de 6 ou 8 anos na residência e levavam uma vida praticamente monástica.


William Osler passando visita à beiro do leito com seus residentes
Em 1927 a AMA (American Medical Association) reconhece a Residência Médica e começa a aprovar os primeiros programas. Desde então, a RM se tornou o padrão-ouro para treinamento médico em especialidades e se disseminou em vários países. No Brasil, o primeiro programa de Residência Médica foi criado  em 1945 no serviço de Ortopedia no recém-inaugurado Hospital das Clínicas da FMUSP. Logo em seguida, em 1948, o Hospital dos Servidores do Rio (IPASE-RJ) abriu diversos programas em Clínica Médica, Pediatria e Cirurgia Geral. Nessa época a residência tinha pouca procura e não havia padronização no processo de seleção ou treinamento. Quem procurava esse tipo de treinamento eram geralmente alunos idealistas e que tinham como se sustentar. 


Hospital das Clínicas da FMUSP na época da sua inauguração na década de 40

Há algumas décadas, se um médico queria ser cirurgião, ele acompanhava um cirurgião como estagiário e a partir de certo momento se auto-intitulava cirurgião, por exemplo. Com a disseminação dos programas de residência médica na década de 70, a exigência de um treinamento formal com residência médica e de uma especialidade cresceu tanto por parte dos hospitais como dos próprios pacientes. Foi nessa época que de fato houve um grande crescimento tanto no número como nas opções de programas de residência. Isso impulsionou a regulamentação da RM em 1977 e a criação da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM)

A residência médica como vemos hoje com bolsa, processos seletivos organizados e fiscalizados, férias remuneradas, etc foi uma conquista de várias gerações de residentes das últimas décadas. Por isso é importante conhecer a história dessa etapa da nossa formação médica.


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